Desfila h&aacute; vinte anos, um marco que poucos carregam na moda brasileira atual. No ateli&ecirc; da Rua Augusta, Rober conversou com L&rsquo;OFFICIEL sobre seu mundo particular

Rober Dognani desfila h&aacute; vinte anos, sem parar. Um marco que poucos carregam na <a href="https://www.revistalofficiel.com.br/moda/editorial-apresenta-uma-ode-a-moda-brasileira">moda brasileira</a> atual e que ajudam a fazer dele um dos nossos grandes criadores. A passarela &eacute; seu lugar favorito: &eacute; onde coloca para fora uma carga dram&aacute;tica que re&uacute;ne seus amores pela moda, suas refer&ecirc;ncias de vida e uma obsess&atilde;o por roupas bem constru&iacute;das. Veterano da <a href="https://www.revistalofficiel.com.br/fashion-week/casa-de-criadores-rober-dognani-a-transicao-entre-vida-e-morte">Casa de Criadores</a> &mdash; onde estreou e se mant&eacute;m at&eacute; hoje, sem pular uma temporada &mdash;, viu as comemora&ccedil;&otilde;es do anivers&aacute;rio eclipsadas pelo falecimento de Iracema, a m&atilde;e que o ajudou a colocar as primeiras cole&ccedil;&otilde;es em p&eacute;. Seus &uacute;ltimos dois desfiles foram dedicados a ela. O primeiro, uma elegia em vida. O segundo, em junho, uma grande e enlutada homenagem, aplaudida de p&eacute;. Arrebanhar a emo&ccedil;&atilde;o e aten&ccedil;&atilde;o da plateia &eacute; algo costumeiro para ele, que ama um desfile e construiu um universo de imagens que &eacute; muito seu, entre poses, mem&oacute;rias, tecidos volumosos, l&aacute;tex e gelo seco. Em contraste, o discurso calmo de quem faz sua arte sem r&eacute;guas ou instrumentos formais. No ateli&ecirc; da Rua Augusta, Rober conversou com L&rsquo;OFFICIEL sobre esse seu mundo particular. Confira!

L&rsquo;OFFICIEL Afinal, s&atilde;o vinte anos de carreira ou de passarela?&nbsp;
ROBER DOGNANI De passarela! Vinte anos de Casa de Criadores, entrei l&aacute; no inverno de 2003. Na &eacute;poca eram 400 inscritos para uma vaga. Ganhei e me peguei com a responsabilidade de criar um desfile, mas n&atilde;o tinha tecido, nem dinheiro, nem costureira. Tive duas sortes ali. A primeira &eacute; que j&aacute; trabalhava na Tecelagem Franceza, que era a loja mais incr&iacute;vel de tecidos do Brasil. Eles gostavam muito de mim e deixaram usar o que eu quisesse. Era tecido da Ungaro, da Armani, seda pura, bordados Jakob Schlaepfer. A minha primeira cole&ccedil;&atilde;o foi toda assim. Imagina? A segunda sorte &eacute; que a minha m&atilde;e, Iracema, era costureira e me ajudou a fazer a cole&ccedil;&atilde;o inteira sozinha, coitadinha. Ela j&aacute; tinha uma certa idade e eu ficava muito no p&eacute;. N&atilde;o era uma cole&ccedil;&atilde;o simples, tinha inspira&ccedil;&atilde;o em Egon Schiele e eu j&aacute; era obcecado por acabamento. Mas saiu! Ela ainda fez o segundo desfile, s&oacute; no terceiro que arrumei algu&eacute;m para me ajudar. Mas no come&ccedil;o era eu, minha m&atilde;e e a Tecelagem Franceza.
&nbsp;L&rsquo;O Voc&ecirc; seguiu trabalhando l&aacute; e desfilando por um tempo, n&atilde;o?&nbsp;
RD Sim, acho que umas 15 temporadas. Eu n&atilde;o tinha a parte comercial, s&oacute; fazia os desfiles; gostava do exerc&iacute;cio e do show. S&oacute; em 2008 &eacute; que comecei a tentar trabalhar uma linha para venda, ainda t&iacute;mida, tentar showroom etc. Esse lado comercial deslanchou mesmo em 2010, quando conheci o Felipe Fanaia e resolvemos montar a Das Haus, nossa loja.&nbsp;
L&rsquo;O Come&ccedil;a a contar a sua carreira quando?&nbsp;
RD Desde a inf&acirc;ncia eu desenhava umas noivinhas, pois no sal&atilde;o da minha m&atilde;e &mdash; que tamb&eacute;m era cabeleireira &mdash; s&aacute;bado era o dia dos casamentos. Mor&aacute;vamos em Fartura, uma cidade de 15 mil habitantes. Ent&atilde;o era um grande acontecimento. Ela levava as noivas arrumadas at&eacute; a porta da igreja e eu ia junto, com 4 anos, ficava fascinado. J&aacute; ali criou uma certa loucura na minha cabe&ccedil;a. Ao mesmo tempo, o meu pai tinha um s&iacute;tio e me levava para ver matar boi, matar porco, fazer lingui&ccedil;a. Eram dois universos bem diferentes. Quando a Lady Di se casou, fiquei obviamente apaixonado por aquele vestido. Lembro bem, foi minha primeira imagem de moda. A segunda, quando o Papa Jo&atilde;o Paulo II veio ao Brasil &mdash; a coisa do manto, do chap&eacute;u, do cajado. Essa suntuosidade da Igreja Cat&oacute;lica sempre me atraiu, a grandiosidade. E minha m&atilde;e me levava para a igreja, &eacute;ramos muito ligados a Nossa Senhora Aparecida. Acho que a minha descoberta de moda veio por a&iacute;. Foi quando ensaiei o que viria fazer hoje. A novela Ti-ti-ti tamb&eacute;m foi um marco para eu desenhar, j&aacute; com uns 12 anos. E lembro da revista Manequim tamb&eacute;m, com aqueles moldes todos. Minha forma&ccedil;&atilde;o de moda foi essa.

&ldquo;DESDE A inf&acirc;ncia EU DESENHAVA UMAS noivinhas, POIS NO SAL&Atilde;O DA MINHA M&Atilde;E &mdash; QUE TAMB&Eacute;M ERA CABELEIREIRA &mdash; S&Aacute;BADO ERA O DIA DOS CASAMENTOS.&rdquo; ROBER DOGNANI

L&rsquo;O Sua moda &eacute; uma vers&atilde;o maximizada desse mix de refer&ecirc;ncias&hellip; Todo um drama. 
RD Sim, j&aacute; tinha um drama. Na adolesc&ecirc;ncia, tive uma escola de dan&ccedil;a, isso pouca gente sabe. Se voc&ecirc; for a Fartura e perguntar sobre o estilista Rober Dognani, talvez as pessoas saibam. Mas se perguntar pelo Roberval da Dan&ccedil;a, com certeza v&atilde;o lembrar! Eu era um adolescente esquisito, usava sapato e cal&ccedil;a social, camisa de seda para ir &agrave; escola, muito quieto. Mas j&aacute; tive vontade de ser bailarino, dan&ccedil;ava em casa, escondido e assistindo a Footloose, essas coisas. Aos 16 anos, inventei de fazer um musical para angariar dinheiro para a viagem de fim de ano da turma da escola, era a oitava s&eacute;rie. Fiz o figurino com a minha m&atilde;e, o palco tinha fuma&ccedil;a, jogo de luz, os meninos com roupa de pele dan&ccedil;ando aquela m&uacute;sica do filme 2001. Uma superprodu&ccedil;&atilde;o! Eu sempre gostei de espet&aacute;culo. Foi um sucesso e, quando vi, tinha 70 alunas numa escola de dan&ccedil;a. Inventava os figurinos, criava coreografias. Isso sem nunca ter feito uma aula de dan&ccedil;a! E os figurinos eram para dar trabalho para minha m&atilde;e, que vendia para as alunas. Acho que meio que come&ccedil;ou a&iacute; a ideia de empreender na moda.&nbsp;
L&rsquo;O Voc&ecirc; nunca fez faculdade?&nbsp;
RD Ent&atilde;o, tem isso. Sempre quis, mas n&atilde;o tinha como pagar. Por isso, fiz o trajeto do estilista que veio para S&atilde;o Paulo para trabalhar na loja de tecidos e aprender na pr&aacute;tica. L&rsquo;O Como voc&ecirc; caiu na Tecelagem Franceza? RD Uma coisa levou &agrave; outra. No final de 1997, resolvi sair de Fartura e mudar para S&atilde;o Paulo. Vim morar com um primo, come&ccedil;ando a vida com R$ 70 no bolso. No terceiro dia fui parar na Rua S&atilde;o Caetano, a Rua das Noivas, que era minha refer&ecirc;ncia direta, e logo consegui o primeiro emprego. Achava que j&aacute; sabia desenhar, n&eacute;? Mas ali percebi que as t&eacute;cnicas de costura que conhecia, do interior, n&atilde;o eram o bastante. Trabalhava com tr&ecirc;s travestis que meio que me adotaram e foram me ensinando a desenhar para as clientes. Lembro de quando tocava Toni Braxton na r&aacute;dio, Unbreak My Heart, elas subiam no balc&atilde;o e dublavam. E eu, um garoto do interior, vendo aquilo. Era um sonho, uma loucura total. De l&aacute;, passei por uma loja de aluguel de vestidos de noiva no Shopping Eldorado, que foi outra descoberta paulistana, e outra na Rebou&ccedil;as &mdash; quando comecei a ter mais contato com o fazer da roupa. Na moda h&aacute; um preconceito contra estilistas de loja de noiva e de tecido, sabe? Eles s&atilde;o discriminados. O chique &eacute; fazer Santa Marcelina, FAAP. Mas foi nesse universo que fui aprendendo. Dali, fui para a Tecelagem Franceza, onde o mundo se abriu &mdash; toda a hist&oacute;ria de conhecer os melhores tecidos. Fiquei l&aacute; por doze anos.

L&rsquo;O Deve ter sido uma grande escola.&nbsp;
RD Sim. E ali fui conhecendo todo mundo. Conheci Clodovil, Guilherme Guimar&atilde;es &mdash; que falava muito baixinho com a gente. Andr&eacute; Lima, Lino Villaventura, Walter Rodrigues &mdash; que me convidou para o primeiro desfile que assisti na vida, no Morumbi Fashion. Fui me inserindo. Na loja, havia uma grande vitrine e eu comecei a fazer moulages nos manequins. Pegava aqueles tecidos incr&iacute;veis, que custavam 6 mil [reais] o metro, para criar as vitrines imensas que davam para a Rua Augusta. As pessoas viam, paravam, comentavam. Da&iacute; foi bacana ver e entender que gostavam do que eu fazia.
&nbsp;L&rsquo;O Voc&ecirc; falou sobre esse preconceito, acha que lhe afetou de alguma maneira?&nbsp;
RD Eu j&aacute; tive vergonha de falar sobre isso, sabe? Pelo meio em que fui me inserindo. Tinha vergonha de falar que trabalhei de estilista de loja de tecido, de loja de noiva. Uma bobagem. Mas, afetar, acho que n&atilde;o &mdash; diria que me ajudou. Porque o segredo da minha profiss&atilde;o &eacute; conhecer o tecido, saber o material correto para a roupa que quer fazer. Todo erro de moda est&aacute; a&iacute;: se a pessoa conhece o tecido ou n&atilde;o. E eu tive essa escola, trabalhando nesses lugares que a vida me proporcionou.&nbsp;
L&rsquo;O Pensando na sua carreira, constru&iacute;da na pr&aacute;tica sem uma base acad&ecirc;mica de moda, sempre me pareceu que voc&ecirc; &eacute; muito instintivo no criar.&nbsp;
RD Eu vou s&oacute; no instinto, &eacute; isso mesmo. N&atilde;o consigo planejar nada.&nbsp;
L&rsquo;O Como funciona, na pr&aacute;tica?&nbsp;
RD Compro o tecido e depois decido o que vai acontecer, basicamente. Hoje eu tenho trabalhado mais com temas, mas n&atilde;o desenho nem programo nada. Vou l&aacute; comprar tecido, vejo o que h&aacute; dispon&iacute;vel nas cores que quero. A cor &eacute; meio que a primeira ideia. Depois, j&aacute; com os tecidos, &eacute; que vou entender o que vem. N&atilde;o tenho molde, n&atilde;o trabalho com medidas, &eacute; tudo muito instintivo. Vou cortando, montando, dali sai uma roupa.
&nbsp;L&rsquo;O Sempre foi assim?&nbsp;
RD Sempre. Mas fico meio obcecado, sabe? S&oacute; penso nisso. &Agrave;s vezes fico rodando e rodando o tecido. &Eacute; algo que cansa a cabe&ccedil;a, mas gosto.
&nbsp;L&rsquo;O &Eacute; mais um fazer art&iacute;stico do que de moda.&nbsp;
RD Depois que descobri o l&aacute;tex, ent&atilde;o&hellip; Algumas roupas nem t&ecirc;m costura.&nbsp;
L&rsquo;O&nbsp; E como entrou nessa hist&oacute;ria?&nbsp;
RD A pira do l&aacute;tex aconteceu porque a minha costureira, Ele - nota, que fazia tudo comigo e foi meu par de m&atilde;os por mais de dez anos, sofreu um acidente de carro e entrou em coma. Hoje ela j&aacute; se recuperou bem, mas ali me peguei sem costureira para fazer o que planejava. Quando ela saiu do hospital, fui at&eacute; ela e trabalhamos juntos, construindo aos pedacinhos, bem com calma. Da&iacute; vi que precisava de algo a mais e resolvi mexer com l&aacute;tex, do nada. Comprei um gal&atilde;o e levei para Fartura, fui testando. Joguei num manequim, esperei secar, juntei com outro tecido e assim foi saindo. At&eacute; hoje o trabalho com l&aacute;tex &eacute; muito de experimenta&ccedil;&atilde;o.

L&rsquo;O De novo, o instinto na jogada.&nbsp;
RD Sim, eu n&atilde;o gosto de medidas, de exatid&atilde;o. N&atilde;o tenho tes&atilde;o com produ&ccedil;&atilde;o, fazer 500 pe&ccedil;as iguais. Gosto de fazer roupa. Por mais que seja uma camisetinha b&aacute;sica, fa&ccedil;o uma por uma, sem medida, jogo um l&aacute;tex. N&atilde;o suporto mexer com tiragem grande. E estou felic&iacute;ssimo assim, tenho tes&atilde;o em vir trabalhar. Adoro.&nbsp;
L&rsquo;O Nunca teve um momento de baixa?&nbsp;
RD Nunca, nem agora que a minha m&atilde;e morreu. Achei que n&atilde;o ia desfilar, n&atilde;o tinha cabe&ccedil;a para fazer isso. Mas a&iacute; veio o prop&oacute;sito de fazer essa cole&ccedil;&atilde;o com a venda revertida para o grupo de apoio aos portadores de c&acirc;ncer da minha cidade. Isso me trouxe motiva&ccedil;&atilde;o e fiz assim, enlouquecidamente, com o maior prazer, em um m&ecirc;s.&nbsp;
L&rsquo;O Acho curioso que sua imagem foi se moldando do fest&atilde;o do come&ccedil;o para essas experimenta&ccedil;&otilde;es mais ousadas, mais urbanas, de hoje.&nbsp;
RD Sim, era fest&atilde;o &mdash; mas n&atilde;o de casamento. Era uma festa de Carnaval, de Halloween, depois veio o l&aacute;tex e as possibilidades se transformaram. Fui moldado naquela &eacute;poca dos grandes desfiles, vendo as revistas que traziam as fotos todas. Era isso que atra&iacute;a o meu olhar. Eu copiava um pouco, claro. Quando estamos come&ccedil;ando, formando identidade, copiamos, nos inspiramos, tentando fazer igual &mdash; a identidade &eacute; captada de v&aacute;rias pessoas. Tenho um pouco de Alexander McQueen, de John Galliano, de Comme des Gar&ccedil;ons. Misturado com as noivinhas, com a Lady Di, com o Papa, com o a&ccedil;ougue. Tudo isso moldou a minha moda.&nbsp;
L&rsquo;O Todo esse drama na passarela, mas voc&ecirc; &eacute; uma pessoa t&atilde;o calma.&nbsp;
RD Eu sou super calmo, mas sempre gostei de drama! Quando era adolescente escutava Carmina Burana. Enquanto meus amigos ouviam Information Society, eu estava no Ray Conniff e no Julio Iglesias. Sempre tive esse p&eacute; no palco.&nbsp;
L&rsquo;O Voc&ecirc; ama fazer desfile, n&eacute;?&nbsp;
RD &Eacute; o que mais gosto, &eacute; o meu momento. N&atilde;o sei se vai vender, n&atilde;o me importo nem penso nisso. Mas o engra&ccedil;ado &eacute; que as coisas mais loucas s&atilde;o as que mais vendem. E sou de uma &eacute;poca em que as pessoas analisavam a costura das roupas da passarela. A gente se preocupava com isso. Um desfile de moda tinha que ter roupa. Fui criado desse modo, sabe? Isso se perdeu no Brasil.

L&rsquo;O Acha que &eacute; um problema?&nbsp;
RD Depende, problema comparado a qu&ecirc;? Se for comparar com os desfiles de fora, a moda que o mundo faz, &eacute; um problema &mdash; se olhar para dentro, n&atilde;o sei&hellip; Para mim, n&atilde;o &eacute;. Sempre fiz a minha roupa desse jeito. H&aacute; quem se expresse de outra forma. Gosto de traduzir a minha onda com uma roupa bem-feita, mas pode-se expressar o seu sentimento, sua viv&ecirc;ncia, sua milit&acirc;ncia na moda de v&aacute;rias maneiras.&nbsp;
L&rsquo;O&nbsp; E h&aacute; uma gera&ccedil;&atilde;o mais nova, que est&aacute; mergulhada na moda, mas nem tem meios para afiar essa liga&ccedil;&atilde;o com a t&eacute;cnica. Concorda?&nbsp;
RD &Eacute; falta de dinheiro, basicamente. Falta um incentivo para essa gera&ccedil;&atilde;o. Tem muita gente que n&atilde;o pode fazer faculdade &mdash; e nem sei se elas ensinam sobre acabamento, hoje. Mas as pessoas, as marcas, n&atilde;o t&ecirc;m dinheiro. Ao mesmo tempo, eu tamb&eacute;m n&atilde;o tive. N&atilde;o tenho grana, mas procuro estudar para fazer um bom acabamento. Quero levar a moda para esse lado da roupa bem constru&iacute;da. &Agrave;s vezes, para outra pessoa, esse n&atilde;o &eacute; o foco &mdash; e tudo bem. Mas acho que toda roupa deveria ser bem-feita, n&atilde;o importa qual seja. H&aacute; uma maneira de voc&ecirc; militar com uma roupa bem-feita, se houvesse esse acesso &mdash; mas &eacute; complicado falar sobre isso, &eacute; tudo muito subjetivo. Pense que o jeans n&atilde;o era chique, nem o moletom &mdash; hoje, foram parar na couture. Pode ser que essa moda da roupa feita no dente, no alfinete, seja o futuro &mdash; e eu, a pessoa antiquada que est&aacute; l&aacute; cuidando da bainha, da costura inglesa.&nbsp;
L&rsquo;O Pensa nesse risco?&nbsp;
RD Penso, viu. Tenho um certo medo de n&atilde;o conseguir acompanhar. Hoje tenho 48 anos, n&atilde;o sou jovem estilista h&aacute; muito tempo. D&aacute; um receio de ficar obsoleto, ultrapassado. Ser&aacute; que a moda ser&aacute; sempre assim, como sei fazer? Voc&ecirc; olha para fora e l&aacute; eles seguem os mesmos padr&otilde;es, os bordados maravilhosos. Aqui, o padr&atilde;o &eacute; diferente &mdash; tamb&eacute;m por uma quest&atilde;o de dinheiro. A moda brasileira n&atilde;o tem mais verba para grandes cen&aacute;rios, grandes modelos para desfilar. Da&iacute; foi-se chamando amigos, criou-se esse casting de pessoas mais diferentes. &Eacute; algo muito nosso, esse remanejamento do &ldquo;o que d&aacute; para fazer&rdquo;. Isso tamb&eacute;m alimenta uma diversidade, uma criatividade, sem d&uacute;vida. A possibilidade de fazer-se uma moda sem um puta investimento. Essa minha &uacute;ltima cole&ccedil;&atilde;o, criei apenas com tule e l&aacute;tex.&nbsp;
L&rsquo;O E t&eacute;cnica. Ao mesmo tempo, voc&ecirc; nunca se preocupou em fazer uma moda que falasse com o momento, com tend&ecirc;ncias. &Eacute; sempre uma hist&oacute;ria muito sua. N&atilde;o seria uma vantagem para n&atilde;o cair no personagem antiquado?&nbsp;
RD Olha, eu queria ser meio como o Karl Lagerfeld. Trabalhando at&eacute; morrer, sabe? At&eacute; o fim, falando com o pessoal mais jovem, de certa maneira. Admiro esse poder de modernidade. E gosto muito de contar essas minhas hist&oacute;rias, minhas refer&ecirc;ncias. Quando fiz o desfile sobre o Gallery, por exemplo. &Eacute; um lugar que nunca fui &mdash; mas acompanhava pelas revistas Manchete, pelo Amaury Jr. Via l&aacute; a Xuxa e o Pel&eacute;, a Hebe Camargo. Foi uma cole&ccedil;&atilde;o dessas mem&oacute;rias. Quando homenageei os estilistas brasileiros que me inspiravam &mdash; Dener, Clodovil, o Ocimar Versolato por quem era apaixonad&iacute;ssimo &mdash;, a mesma coisa.

L&rsquo;O Voc&ecirc; est&aacute; com 48 anos, mas carrega esse poder de se colocar em contato com uma gera&ccedil;&atilde;o mais jovem &mdash; pelos shows, pelas t&eacute;cnicas. Acaba funcionando como uma ponte entre esse pensamento de moda mais antigo &mdash; do tecido bom, da alta-costura &mdash; enquanto constr&oacute;i uma imagem contempor&acirc;nea. Concorda?&nbsp;
RD Voc&ecirc; falando assim, eu vejo. Mas, de novo, &eacute; instintivo. Tenho muitas clientes, artistas, que dialogam com o hoje. Por mais que coloque uma m&uacute;sica que ningu&eacute;m vai conhecer nas trilhas sonoras, esse p&uacute;blico mais jovem lembra de algo que a av&oacute; escutava. Ent&atilde;o esse di&aacute;logo acontece. E atinjo um p&uacute;blico que procura uma moda interessante. O meu prazer &eacute; ver as pessoas usando, quando vejo que gostam do meu trabalho. Isso me deixa extremamente feliz. Por isso nem tenho acervo guardado, nada. Prefiro que a minha roupa esteja com outra pessoa, tendo uma vida, a estar guardada comigo.&nbsp;
L&rsquo;O Acha que tem o reconhecimento merecido da ind&uacute;stria?&nbsp;
RD Considero que sim. Tenho as minhas clientes fi&eacute;is, sou convidado para fazer coisas interessantes, as roupas saem nas revistas. Mas sou t&atilde;o tranquilo quanto a isso&hellip; quero fazer o meu trabalho bem e que as pessoas gostem. N&atilde;o sou aquele estilista famoso no Brasil inteiro, claro. &Eacute; meio engra&ccedil;ado que, at&eacute; cinco anos atr&aacute;s, eu ainda era chamado de jovem talento. O reconhecimento do estilista no Brasil vem meio como em ondas. Quando fiz Verdades secretas, veio uma onda. Quando vesti Lizzo, Naomi, Gisele, Sabrina Sato, Pabllo Vittar&hellip; Acho que isso &eacute; importante na carreira, ter sempre um bafonzinho acontecendo.&nbsp;
L&rsquo;O Depois de vinte anos de Casa de Criadores, voc&ecirc; &eacute; o grande veterano que continua no grupo. N&atilde;o considera mudar de rumo?&nbsp;
RD Gosto tanto de l&aacute; que n&atilde;o tenho vontade de sair. Chego com as minhas roupinhas, a passarela est&aacute; l&aacute;, a luz, sei como funciona. E sou grato &agrave; Casa e ao Andr&eacute; Hidalgo por tudo que fizeram pela minha carreira. Claro que j&aacute; tive vontade de fazer SPFW. Na &eacute;poca que tentei, disseram que eu n&atilde;o estava preparado pois precisava de um business mais estruturado. Hoje, n&atilde;o quero mais. Estou feliz onde estou. Mas tenho um sonho de fazer um desfile em Paris, dar um close especial por l&aacute;? Quem sabe?&nbsp;
L&rsquo;O Pensa mesmo em morrer fazendo desfiles?&nbsp;
RD Amo o que fa&ccedil;o, de verdade. Venho trabalhar feliz, produzo com gosto &mdash; &agrave;s vezes saio do ateli&ecirc; e fico em casa trabalhando com l&aacute;tex at&eacute; de madrugada. Realmente amo. Claro que posso enjoar em algum momento mas, agora, seria infeliz se fizesse outra coisa.

MODELOS: Stella Bovo e Harumi.
BELEZA: K&eacute;rol.
 ASSISTENTE DE FOTOGRAFIA: Victoria Cavalcante.

Rober Dognani, da Casa de Criadores, fala sobre coleções

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